Folha de SP, 30/09/07: Ilustrada.

16/08/2007 - 09h52
Conheça a poesia engajada de João Cabral de Melo Neto;
leia capítulo Publicidade da Folha Online

A obra de João Cabral de Melo Neto (1920-1999) é uma das maiores criações da cultura brasileira do século 20. Se trata de uma poesia cerebral e não emotiva. O poeta recorre a uma construção elaborada da linguagem para criar uma atmosfera poética. Leia introdução abaixo.
Divulgação

Capa de "João Cabral de Melo Neto", da Publifolha
O livro "João Cabral de Melo Neto", da série "Folha Explica", de autoria de João Alexandre Barbosa, editado pela Publifolha, traz a obra de um escritor que se soube se engajar com a realidade social e humana ao seu redor.
Poemas como Morte e Vida Severina e O Cão sem Plumas estarão, para sempre, incluídos entre os maiores que a poesia brasileira produziu. Seu rigor formal e expressivo pode ser visto como uma lição que não é só de poesia, mas também de ética.
O autor João Alexandre Barbosa, autor do livro, é professor de teoria literária e literatura comparada da USP, onde foi pró-reitor de Cultura e Extensão Universitária e presidente da editora (Edusp).
A série "Folha Explica" ambiciona explicar os assuntos tratados e fazê-lo em um contexto brasileiro: cada livro oferece ao leitor condições não só para que fique bem informado, mas para que possa refletir sobre o tema, de uma perspectiva atual e consciente das circunstâncias do país.
*

Introdução: Os contextos do poeta e da obra
Entre os anos 40 e 90, durante cinco longas décadas, surgindo depois da enorme efervescência da poesia dos anos 30 e influindo vivamente na formação das vanguardas poéticas dos anos 50 e 60, a obra de João Cabral de Melo Neto (1920-99) deixa ler um largo trecho da história da poesia brasileira moderna e contemporânea, ao mesmo tempo que se identifica como um paradigma fundamental para o futuro dessa história. Mas foi nos anos 50 que mais claramente se configurou o seu traçado.
A publicação, em 1956, pela José Olympio, do livro Duas Águas, ao mesmo tempo que reunia a obra de João Cabral, com os livros dos anos 40 e 50 - de Pedra do Sono, de 1942, a O Rio ou Relação da Viagem Que Faz o Capibaribe de Sua Nascente à Cidade do Recife, de 1954 -, incluía também três novos livros. Os dois primeiros escritos entre 1954 e 1955, e o último, em 1955: Morte e Vida Severina: Auto de Natal Pernambucano, Paisagens com Figuras e Uma Faca Só Lâmina, ou Serventia das Idéias Fixas.
O título da coletânea, cuja primeira referência era a um certo tipo de telhado muito comum em casas simples do Nordeste, sugeria também uma divisão da obra em duas vertentes: a dos poemas voltados para a expressão de estados oníricos e de vigília, em que se mesclam emoções, afetividades e consciência do próprio fazer poético, que, de um modo geral, corresponde às obras publicadas até 1947, com Psicologia da Composição; e a de uma poesia mais transitiva e, por assim dizer, social, que, iniciando-se com o longo poema de 1950, O Cão sem Plumas, atinge o seu ápice com Morte e Vida Severina, publicado em 1956.
É claro que a divisão não pode ser tomada ao pé da letra: nem a primeira vertente está esvaziada das preocupações sociais e mesmo históricas que aparecerão como dominantes na segunda, nem esta pode ser devidamente apreciada sem as tensões entre o dizer e o fazer que são, com freqüência, tematizadas na primeira. De qualquer modo, foi um grande acontecimento na bibliografia do poeta.
Era a sua primeira publicação por editora comercial de primeiríssima ordem no circuito editorial brasileiro de então, pois todos os seus livros anteriores haviam sido publicados por ele mesmo ou por amigos, em pequenas e quase secretas tiragens. (Com exceção dos Poemas Reunidos, de 1954, sua primeira edição comercial, publicados pela pequena editora Orfeu, e de O Rio, que, tendo sido premiado por ocasião do IV Centenário da Cidade de São Paulo, foi editado, com maior estridência, pela própria comissão organizadora do evento.) Por outro lado, a data de publicação coincidia com a do aparecimento de duas obras que vieram mexer profundamente no cânone literário brasileiro, do lado da prosa ficcional: Grande Sertão: Veredas e Corpo de Baile, de João Guimarães Rosa (1908-67).
Os conteúdos regionalistas da obra desse último autor não podiam ser acessados sem uma passagem obrigatória por um intenso e transformador trabalho literário, chegando-se a um universalismo alimentado pelo concreto da realidade que era lido pelo sábio tratamento das abstrações da linguagem. Assim, as Duas Águas, ao mesmo tempo que localizavam a poesia num espaço regional, o do Nordeste, e por força do trabalho poético que se definia pelas tensões entre as duas águas, criavam também o espaço para que esse regional fosse apreendido de modo mais crítico e, por aí, mais universal.
Desse modo, talvez a melhor leitura a fazer do título da antologia seja a de revezamento ou, no mínimo, de mistura, em que a predominância seja antes da existência de águas do que de duas: a da poesia que se espraia e que unifica emoções, afetividades e pensamentos do poeta por entre a variedade dos estímulos da realidade.
Realidade que, para ele, parece ser tanto a da própria poesia, com a sua história e a sua linguagem, por onde passam leituras de outros poetas e outras tradições poéticas, e a reflexão sobre elas no corpo do próprio poema que está sendo escrito, quanto a da sua região de origem, também com a sua história e a sua linguagem. A articulação entre as duas, propiciando o aparecimento de ambigüidades e tensões específicas do trabalho poético, vai estar no núcleo da sua poética, e, por isso mesmo, aquele livro de 1956 não é só um resumo da obra produzida até então, mas um módulo, ou mapa de orientação, para o que virá em seguida.
Por outro lado, tal articulação vinha responder a uma outra, mais geral, de contexto: a das pressões sofridas por qualquer poeta que se iniciasse nos anos 40 no Brasil.Era, por um lado, a existência muito viva de uma forte tradição pós-modernista de poesia, representada, sobretudo, por Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade, Murilo Mendes, Jorge de Lima e Augusto Frederico Schmidt; e, por outro, os ecos ainda muito fortes de todo o movimento regionalista da ficção da década de 30, em que sobressaíam José Lins do Rego, Graciliano Ramos, Jorge Amado e Raquel de Queirós, entre outros.
À primeira fonte de pressões respondeu-se, de um modo geral, com uma poesia de imitação diluidora, acentuando-se os aspectos "poéticos" (as aspas aqui têm valor negativo), refugando algumas conquistas do próprio modernismo de 22, como, por exemplo, o humor e o veio coloquial e irônico (conquistas que, originadas em Oswald e Mário de Andrade, se ampliavam sobretudo através de um Manuel Bandeira e de um Carlos Drummond de Andrade), ou mesmo o aproveitamento de valores da prosa na realização do poema. O resultado era uma poética de raridades, mais chegada às abstrações de uma lírica da subjetividade do que ao concreto da realidade, privilegiando-se a sabedoria técnica do verso e o retorno programático a formas tradicionais do poema, de que o soneto foi o melhor exemplo. Foi o caminho tomado por grande parte dos poetas que constituíram a chamada "Geração de 45", a que somente por um acidente cronológico se tem juntado o nome de João Cabral.
À segunda ordem de pressões, a resposta em alguns poetas e poemas foi a da excessiva folclorização, tendendo ao exotismo regional e, às vezes, chegando mesmo à imitação grotesca de falares localizados. Uma poesia caipira, ou sertaneja, que muito pouco tinha a ver com a verdadeira poética a ser extraída da cultura popular, num esquecimento lastimável daquilo que havia sido a grande lição dos estudos sobre a cultura popular de um Mário de Andrade ou de um Câmara Cascudo, por exemplo, de onde resultou a síntese antiexótica que foi o Macunaíma, ou mesmo do que era torturada busca pela autenticidade regional na poesia de largo sopro épico de um Jorge de Lima.
A poesia de João Cabral será, na verdade, uma resposta a essas duas fontes de pressão e uma busca incessante de articulação entre as duas. Para a primeira, o leitor encontra a melhor resposta no poema "Antiode", uma espécie de declaração de princípios "antipoéticos" (e aqui as aspas têm valor positivo), incluído no livro Psicologia da Composição.
A esse poema ainda voltaremos, e baste agora dizer que, trazendo um subtítulo implacável e devastador com relação àquilo que se fazia na continuidade da grande tradição lírica pós-modernista e que se configurava como definição da Geração de 45, contra a poesia dita profunda, a "Antiode" buscava realizar uma limpeza nos despojos líricos tradicionais, precisamente ali onde mais se escondem os ardis da inconsciência poética, isto é, nas relações dadas e aceitas, sem discussão, entre poesia e imagem.
Já nas duas primeiras estrofes do poema, essas relações são postas sob suspeição:
Poesia, te escrevia:
flor! conhecendo
que és fezes.
Fezes
como qualquer,
_gerando cogumelos
_(raros, frágeis cogu-
_melos) no úmido
_calor de nossa boca.

É esse sentido de limpeza, ainda que pareça irônico o uso da palavra na substituição que o poeta faz de flor por fezes, que permite, nas últimas estrofes do poema, a superação da imagem pela linguagem:

Poesia,
não será esse
o sentido em que
ainda te escrevo:
flor! (Te escrevo:

flor! Não uma
flor, nem aquela
flor-virtude -
em disfarçados
urinóis.)

Flor é a palavra
flor, verso inscrito
no verso, como as
manhãs no tempo.

Já para a segunda forma de pressão, a resposta mais completa foi dada com a publicação do poema O Cão sem Plumas, em que a matéria regional é tratada pelo verso rigoroso e disfórico que o poeta aprendera a dominar nos livros publicados até 1947. Na verdade, esse poema parece ser uma dupla resposta: à pressão de época mencionada e ao próprio estágio a que chegara João Cabral com as três partes que constituem Psicologia da Composição, onde a predominância é de poemas, como a "Antiode", em que sobressaem a negatividade e a recusa do lírico.
Agora, tratava-se de criar um espaço poético em que fosse possível, sem negar as conquistas da aprendizagem anterior, ainda que negativas, dar expressão a significados social e historicamente mais amplos. Criava-se, e é o que o poema vem fixar pela primeira vez em sua obra, uma estreita dependência entre poética e ética, ou entre poesia e conhecimento social e histórico, como uma maneira de inserção nos debates então muito acesos acerca das relações entre criação poética e expressão da realidade.
As respostas iniciais de João Cabral, portanto, serão, daí por diante, as marcas tensas de uma poesia que, querendo-se consciente do fazer e da construção, se abre, cada vez mais, para o dizer da experiência dos homens e do mundo.
Consciência para a feitura e a construção do poema, que o transformaram em verdadeiro ícone para as vanguardas poéticas que surgiam em fins dos anos 50, e abertura para o dizer da experiência, traço que compartilhava com os seus mestres pós-modernistas, um Drummond, um Bandeira, um Murilo Mendes: eis as duas faces de sua poesia que logo o identificaram como um dos mais importantes poetas da época. O que só fez se confirmar e ampliar com a publicação de sua obra posterior: um dos mais importantes poetas brasileiros do século 20.

A análise dessa evolução, pela leitura individualizada das obras, é o objetivo deste livro. Cada capítulo, apreendendo momentos da obra de João Cabral, segue uma sucessão cronológica, a fim de dar ao leitor uma ordem de leitura. Por isso, os títulos dos capítulos buscam fixar aquilo que há de mais característico em cada momento.
"João Cabral de Melo Neto"
Autor: João Alexandre Barbosa
Editora: Publifolha
Páginas: 112
Quanto: R$ 17,90
Onde comprar: Nas principais livrarias, pelo telefone 0800-140090 ou pelo site da Publifolha
Acompanhe as notícias em seu celular: digite o endereço wap.folha.com.br


Leia mais
Livro explica obra de 60 autores da literatura brasileira atual
Leitor reencontra universo de Clarice Lispector 30 anos após morte da escritora
Roteiro indica o que ler de Carlos Drummond de Andrade
Alfredo Bosi desvenda vida e obra de Machado de Assis
Professor destrincha e analisa obra de Manuel Bandeira
Livro explica Guimarães Rosa e sua principal obra

O polêmico acordo de unificação ortográfica. Confira!

Membro da Comissão Nacional de Língua Portuguesa, professor professor de Lingüística da USP José Luiz Fiorin, explica o acordo de unificação ortográfica que está causando dúvidas no Brasil e em Portugal.

“A Língua Portuguesa não está correndo perigo”, Leia a entrevista. E, Leia mais: Especialista fala sobre o polêmico acordo de unificação ortográfica

Regionalismo - Literatura das peculiaridades do Brasil

O regionalismo tem uma tradição de quase 150 anos na literatura brasileira. Surgiu em meados do século 19, nas obras de José de Alencar, de Bernardo Guimarães, de Alfredo d'Escragnole Taunay e de Franklin Távora e pode-se dizer que há textos de cunho regionalista em nossa literatura até o final do século 20.Pode-se dizer que as obras do século 20 são os grandes textos do regionalismo no Brasil. Entretanto, para se chegar a expoentes como José Lins do Rego, Graciliano Ramos, Érico Veríssimo e Guimarães Rosa, o gênero percorreu um grande caminho, cujas raízes estão na época do romantismo, como foi o caso da obra de José de Alencar.
Em primeiro lugar cabe esclarecer que, por regionalismo, entende-se a literatura que põe o seu foco em determinada região do Brasil, visando retratá-la, de maneira mais superficial ou mais profunda. Os primeiros autores do gênero não focalizavam propriamente uma região, no sentido geográfico, não visavam mostrar a vida no sertão do Nordeste, ou de São Paulo ou do Rio Grande do Sul.
Escritores sertanistas
Chama-se de autores de sertanistas aqueles cujo foco está no sertão, por oposição à cidade, à Corte, ao Rio de Janeiro - a única localidade com características efetivamente urbanas no Brasil do século 19. Focalizar o homem do sertão era uma forma de ir além do indianismo que - surgido na década de 1830 como forma de afirmação da nacionalidade - já se esgotara nas décadas de 1860 e 1870.O sertanejo torna-se então o símbolo do autêntico brasileiro, alheio às influências da Europa, abundantes na sociedade fluminense. É nesse sentido que ele irá protagonizar os romances de Bernardo Guimarães, Taunay e Franklin Távora, constituindo uma metamorfose do "bom selvagem" que o Peri (personagem central O Guarani") ou Ubirajara haviam personificado nos romances de Alencar anteriormente. Do que já se deduz que o sertanejo romântico também padece de uma idealização heróica que o afasta da realidade.Além disso, os romances sertanistas são marcados por um "pequeno realismo" - como afirma o estudioso Nelson Werneck Sodré - que está preocupado em retratar as minúcias do vestuário, da linguagem, dos costumes, das paisagens e em valorizar o caráter exótico e grandioso da natureza brasileira. Nesse pano de fundo, decorrem os enredos marcados por amores, aventuras e peripécias como mandava o figurino da literatura romântica.
Bernardo Guimarães
Desde seu primeiro livro "O Ermitão de Muquém", o autor deixa claro seu autor de documentar uma realidade, como revela o subtítulo do romance: "História da Fundação da Romaria de Muquém na Província de Goiás". Mas voltamos a ressalvar: trata-se daquela documentação superficial, mais atenta ao que se vê e não ao que está por trás das aparências.Suas obras mais conhecidas devem seu sucesso principalmente ao tema que abordam, segundo o crítico literário Alfredo Bosi. Ele se refere a "O Seminarista", que critica o celibato clerical, e "A Escrava Isaura", que critica a escravidão. É importante ressaltar, porém, que se trata de uma crítica tardia, surgida quando boa parte da sociedade brasileira já aderira à causa abolicionista. Além disso, não se pode deixar de lembrar que a personagem é uma escrava branca, pois seria inconcebível ao Brasil daquela época que uma negra protagonizasse um romance.Apesar disso tudo, não se pode deixar de dizer que o enredo de "A Escrava Isaura" tem força e apelo, tanto que se transformou em novela exibida pela Globo em 1976/77 e fez sucesso não só no Brasil, mas em diversos outros países nos quais foi exibida, em particular em Cuba e na China, onde a atriz Lucélia Santos, que fazia o papel de Isaura, tornou-se uma celebridade. Além disso, voltou à telinha em 2004, numa novela da TV Record.
Visconde de Taunay
Segundo Alfredo Bosi, "por seu temperamento e cultura, o visconde de Taunay tinha condições de dar ao regionalismo sua versão mais sóbria. Homem de pouca fantasia, muito senso de observação, formado no hábito de pesar com a inteligência as suas relações com a paisagem e o meio (era engenheiro, militar e pintor), Taunay foi capaz de enquadrar a história de "Inocência" (1872) em um cenário e em um conjunto de costumes sertanejos onde tudo é verossímil. Sem que o cuidado de o ser turve a atmosfera agreste e idílica que até hoje dá um renovado encanto à leitura".De fato, "Inocência" é uma pequena obra-prima, com um enredo que também é capaz de seduzir o público de várias épocas. Tanto é que também chegou às telas do cinema em 1982, com direção de Walter Lima Jr. e a atriz Fernanda Torres no papel da personagem principal. O enredo gira em torno de o casamento de Inocência ter sido acertado pelo pai da moça, que, no entanto, se apaixona por um outro homem.
Franklin Távora
O cearense Franklin Távora é o primeiro a tentar fazer do regionalismo um movimento, escrevendo um manifesto e apresentando um projeto no prefácio de seu romance "O Cabeleira". O romance, porém, não acompanha às pretensões do autor. É uma obra medíocre que mistura uma crônica do cangaço (o personagem-título é um cangaceiro) com os expedientes melodramáticos da pior ficção romântica.No entanto, ele abre um ciclo em nossa literatura: são vários os romances que tematizam o cangaço e o banditismo originário das peculiaridades do Nordeste: a seca, o latifúndio, a miséria. As grandes obras nacionais sobre o cangaço, contudo, só iriam ser escritas no século 20: "Cangaceiros", de José Lins do Rego, e "Seara Vermelha", de Jorge Amado.
Este último, marcado por um caráter de propaganda comunista (o autor era filiado ao Partido Comunista Brasileiro, pelo qual foi deputado), apresenta o cangaceiro como um herói revolucionário, o que também é uma idealização não condizente com a realidade.

*Antonio Carlos Olivieri é escritor, jornalista e diretor da Página 3 Pedagogia & Comunicação.

Viagem - Análise do livro de Cecília Meireles

"Viagem" (1937) é o primeiro livro que a própria Cecília Meireles levou a sério. Os anteriores: "Espectros" (1919), "Nunca Mais..." (1923), "Poemas dos Poemas" (1923) e "Baladas para El-Rei" (1925), a própria autora retirou da primeira reunião de sua "Obra Poética", publicada pela Aguilar, em 1958.Não se sabe bem o porquê, mas os críticos deduzem que talvez tenha sido para se desvincular do grupo católico ao qual estava ligada e com quem colaborou por muitos anos e também para se afastar do Simbolismo, forte característica do início de sua produção e tão ao gosto do grupo da revista "Festa", editada por Tasso da Silveira e Andrade Murici e na qual Cecília Meireles publicou seus primeiros poemas.
Projeto de modernismo
É possível perceber que os poemas de "Viagem", que cobrem o período de 1929 a 1937, são um projeto empenhado da autora, que buscava fazer poesia de qualidade, vinculada à tradição literária e à poesia modernista. Com o livro, Meireles ganhou em 1938 o prêmio da Academia Brasileira de Letras, causando críticas mordazes, principalmente de Mário de Andrade (em artigo que se encontra na coletânea "O Empalhador de Passarinho"), por ela ter se curvado à "perniciosa e pouco fecunda" ABL.Todavia, o crítico paulista acaba elogiando a "força criadora" da poetisa e diz que a Academia é quem foi premiada ao conceder o prêmio a Cecília Meireles. Andrade considera que "com Viagem ela se firma entre os maiores poetas nacionais".
Epigramas
"Viagem" é composta de 99 poemas, dentre os quais 13 são epigramas, que é um tipo de poema curto, nascido na Antigüidade Clássica, mordaz, picante ou satírico. Com eles, Meireles trata da felicidade, da poesia, do amor e até da morte, aproveitando menos a sátira e mais a mordacidade. Os epigramas, à medida que vão surgindo, costuram e dão unidade a obra.No Epigrama nº 1, que abre o livro, trata da própria poesia, "uma sonora ou silenciosa canção/flor do espírito, desinteressada e efêmera". Arremata afirmando que a poesia embeleza o mundo, ainda que isso seja inútil. Fecha o livro com o Epigrama nº 13, mostrando quem passou pelos caminhos: "reis coroados de ouro,/e heróis coroados de louro,[...] os santos, cobertos de espinhos", e por fim, "Os poetas, cingidos de cardos". O amarelo-ouro e os espinhos da referida flor concentram as homenagens anteriores, deste modo, parecem exaltar a importância dos poetas.
Obra de Cecília Meirelles
Os demais poemas apresentam variação tanto nos temas como nas formas. Aparecem versos livres, metrificados e também rimados. A poetisa procura, inclusive, se aproximar da cultura popular, como faziam os Modernistas de 22, visto que há poemas intitulados Rimance, Quadras, Feitiçaria, Cantiga, Canção, Cantiguinha etc.Os temas são ecléticos e por vezes bem simples, elevados pela reflexão quase silenciosa da autora, como: Grilo, Praia, Horóscopo, Realejo entre outros. Também aparecem na obra, poemas sobre a incompreensão humana e sobre o tema clássico da tradição literária: a brevidade da vida.Talvez isso tenha a ver com própria autora, visto que conviveu com perdas desde cedo. Seu pai morreu antes de seu nascimento e sua mãe quando ela tinha apenas três anos.
Mar, música e coresÉ também muito clara, a intenção da poetisa em tratar de música, luzes e cores, por meio da natureza, aguçando a visão e a audição do leitor para aquilo que o eu-lírico vê e ouve. O mar é seu tema predileto, por onde se viaja quase que o tempo todo. E a música está em praticamente todos os poemas, tanto em cantos, como em sons da natureza, como na própria sonoridade da sua poesia.Os dois livros seguintes da autora: "Vaga Música" e "Mar Absoluto" e outros poemas parecem não só ampliar, mas também detalhar o trabalho de "Viagem".Uma estrofe de Motivo, segundo poema do livro "Viagem", resume um pouco o que há na obra: "Eu canto porque o instante existe/e a minha vida está completa./Não sou alegre nem sou triste:/sou poeta."

Poesia modernista - Tudo pode servir de tema

Muito se tem falado sobre o processo de inovação desencadeado pelo primeiro tempo da poesia modernista. É bom que se tenha em mente que o que foi produzido no momento subseqüente ao da Semana de Arte Moderna de 1922 é uma espécie de matriz do que viria a ser a poesia contemporânea.Não se trata aqui de dizer, sob o risco da simplificação, que, desde aquela época, a poesia não incorporou outros valores expressivos. O que é preciso lembrar é que foi naquele período que o próprio conceito de lirismo sofreu profundas modificações.
A dessacralização do objeto poético foi certamente uma delas, talvez a principal. Tudo passou a ser matéria da poesia. Uma sensibilidade permeada pelo intelecto e a consciência explícita dos processos de criação literária fizeram da poesia modernista um espaço de discussão de temas pertinentes ao próprio fazer poético. A título de exemplo, lembremos poemas como "Poética" ("Estou farto do lirismo comedido..."), de Manuel Bandeira, verdadeira "carta-programa" do modernismo, ao lado das paródias de textos do romantismo e da literatura informativa sobre o Brasil, dos poemas-piada de Oswald de Andrade etc.
A própria língua portuguesa, ferramenta básica da criação literária, foi tema de reflexão. Os conhecidos versos de "Pronominais" ("Dê-me um cigarro/ Diz a gramática/ Do professor e do aluno/ E do mulato sabido/ Mas o bom negro e o bom branco/ Da Nação Brasileira/ Dizem todos os dias/ Deixa disso camarada/ Me dá um cigarro"), de Oswald de Andrade, já discutiam à época um problema até hoje não resolvido pela gramática -pelo menos por sua vertente mais tradicional.
Na linguagem oral, a colocação do pronome átono no início do período ("Me dá um cigarro") é natural entre os falantes brasileiros do português. As gramáticas tradicionais, entretanto, ainda não incorporaram essa peculiaridade. Os modernistas, a propósito de aproximar a poesia da fala e de valorizar a arte como fator de identidade cultural, num momento de grande efervescência crítica, procuraram perceber essas idiossincrasias da dicção brasileira e agregá-las à literatura.Na leitura de "Amar: Verbo Intransitivo", de Mário de Andrade, é experimentada essa "língua brasileira". Os pronomes átonos, por exemplo, aparecem no início das frases, em franca atitude de rebeldia antiacadêmica.
Os valores da cultura acadêmica, de modo geral, são questionados. Permeia o modernismo um espírito de renovação voltado para o encontro de nossas raízes.

Mário de Andrade cria uma metáfora do Brasil - Macunaíma

A diversidade dá o tom de "Macunaíma", um dos principais textos escritos pelo poeta, romancista, crítico de arte, folclorista, musicólogo e ensaísta paulistano Mário de Andrade (1893 - 1945). Editado em 1928, embora escrito em 15 dias, no final de 1926, numa fazenda da família, em Araraquara, interior de São Paulo, trata-se de leitura obrigatória para a discussão do que significa ser brasileiro. Mitos e lendas indígenas, sobretudo amazônicos, recolhidos e publicados pelo etnólogo alemão Koch-Grünberg, além de provérbios e registros folclóricos, são articulados de modo a construir uma espécie de alegoria nacional em torno da história do protagonista. Chamado de "herói sem nenhum caráter", sua frase preferida é "Ai, que preguiça!".
Atrás do muiraquitãNascido numa tribo amazônica, Macunaíma tem dois irmãos, Maanape e Jiguê, e, diferentemente dos habitantes da aldeia, sua personalidade se baseia em mentiras, traições, safadezas e uma vontade imensa de nada fazer e de ter conforto. Espécie de somatório do que existe de pior no Brasil, Macunaíma se apaixona pela índia Ci, a Mãe do Mato. Depois da morte da índia e do filho, no parto, ele dá pela falta da pedra conhecida como muiraquitã, amuleto que recebera de presente dela.Desesperado feito criança quando perde algo ao qual se apega, ele consegue descobrir que seu objeto de desejo está em poder do mascate peruano e comedor de gente Vesceslau Pietra, chamado de gigante Piamã, que morava em São Paulo. A narrativa passa então a se concentrar na viagem dos três irmãos para a cidade em busca da pedra.Vitorioso, Macunaíma regressa à Amazônia, mas perde novamente o muiraquitã. Vencido pelo desânimo, vai até o feiticeiro Piauí-Pódole, que o transforma na constelação de Ursa Maior. Fica assim no firmamento sem ter utilidade alguma para os seres humanos.
Modo de falar nacional
A classificação do texto está imersa em debates desde a criação. O autor a chamou de "história" para aproximá-la dos contos populares, mas, não satisfeito, decidiu depois considerá-la uma "rapsódia", gênero popular marcado pela riqueza e variedade de motivos populares. Para complicar ainda mais, a obra tem características épicas, no sentido de ser a jornada de um personagem que representa uma nacionalidade, em busca de um objetivo. Há ainda o humor, que permeia toda a narrativa.Defensor de uma "gramatiquinha" brasileira que desvincularia o português do Brasil do de Portugal, tendência que já vinha em andamento desde o período romântico, o livro valoriza as raízes brasileiras e o modo de falar nacional. No célebre episódio da Carta pras Icamiabas, por exemplo, existe uma paródia ao português de Portugal antigo, totalmente diferente do modo de falar e de escrever no Brasil.Uma das figuras mais importantes e eruditas da Semana de Arte Moderna de 1922, Mário de Andrade constrói sua jornada com total liberdade espacial e temporal. Macunaíma, em poucas linhas, viaja de uma parte do Brasil para outra e conversa com pessoas de épocas diferentes.Assim, ele dialoga com o explorador português João Ramalho (século 16), o desenhista francês Hércules Florence (século 19) e com o industrial nordestino Delmiro Gouveia (século 20), que criou a primeira fábrica nacional de linhas de costura e foi pioneiro da usina hidrelétrica de Paulo Afonso. Cria, assim, uma metáfora de um Brasil repleto de anti-heróis.

*Oscar D'Ambrosio, jornalista, mestre em artes pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista (Unesp), é crítico de arte e integra a Associação Internacional de Críticos de Artes (Aica - Seção Brasil).*Especial para a Página 3 Pedagogia & Comunicação

A Rosa do Povo - Drummond

A Rosa do Povo - Carlos Drummond de Andrade


From: vestibular, 11 months ago





by Etapa Vestibulares


SlideShare Link


Como ler um texto (Andréa Machado e Edson Teixeira)

O aprendizado da leitura

Interessa a todos saber que procedimento se deve adotar para tirar o maior rendimento possível da leitura de um texto. Mas não se pode responder a essa pergunta sem antes destacar que não existe para ela uma solução mágica, o que não quer dizer que não exista solução alguma. Genericamente, pode-se afirmar que uma leitura proveitosa pressupõe, além do conhecimento lingüístico propriamente dito, um repertório de informações exteriores ao texto, o que se costuma chamar de conhecimento de mundo. A título e ilustração, observe a questão seguinte, extraída de um vestibular da UNICAMP:
Às vezes, quando um texto é ambígüo, é o conhecimento de mundo que o leitor tem dos fatos que lhe permite fazer uma interpretação adequada do que se lê. Um bom exemplo é o texto que segue:
As videolocadoras de São Carlos estão escondendo suas fitas de sexo explícito. A decisão atende a uma portaria de dezembro de 1991, do Juizado de Menores, que proíbe que as casas de vídeo aluguem, exponham e vendam fitas pornográficas a menores de 18 anos. A portaria proíbe ainda os menores de 18 anos de irem a motéis e rodeios sem a companhia ou autorização dos pais. (Folha Sudeste, 6/6/92)
É o conhecimento lingüístico que nos permite reconhecer a ambigüidade do texto em questão (pela posição em que se situa, a expressão sem a companhia ou autorização dos pais permite a interpretação de que com a companhia ou autorização dos pais os menores podem ir a rodeios ou motéis). Mas o nosso conhecimento de mundo nos adverte de que essa interpretação é estranha e só pode ter sido produzida por engano do redator. É muito provável que ele tenha tido a intenção de dizer que os menores estão proibidos de ir a rodeios sem a companhia ou autorização dos pais e de freqüentarem motéis.
Como se vê, a compreensão do texto depende também do conhecimento de mundo, o que nos leva à conclusão de que o aprendizado da leitura depende muito das aulas de Português, mas também de todas as outras disciplinas sem exceção.

- Três questões básicas
Uma boa medida para avaliar se o texto foi bem compreendido é a resposta a três questões básicas:
I - Qual é a questão de que o texto está tratando? Ao tentar responder a essa pergunta, o leitor será obrigado a distinguir as questões secundárias da principal, isto e, aquela em torno da qual gira o texto inteiro. Quando o leitor não sabe dizer do que o texto está tratando, ou sabe apenas de maneira genérica e confusa, é sinal de que ele precisa ser lido com mais atenção ou de que o leitor não tem repertório suficiente para compreender o que está diante de seus olhos.
II - Qual é a opinião do autor sobre a questão posta em discussão? Disseminados pelo texto, aparecem vários indicadores da opinião de quem escreve. Por isso, uma leitura competente não terá dificuldade em identificá-la. Não saber dar resposta a essa questão é um sintoma de leitura desatenta e dispersiva.
III - Quais são os argumentos utilizados pelo autor para fundamentar a opinião dada? Deve-se entender por argumento todo tipo de recurso usado pelo autor para convencer o leitor de que ele está falando a verdade. Saber reconhecer os argumentos do autor é também um sintoma de leitura bem feita, um sinal claro de que o leitor acompanhou o desenvolvimento das idéias. Na verdade, entender um texto significa acompanhar com atenção o seu percurso argumentativo.
Francisco Platão Savioli é Professor e Autor de Português do Anglo Vestibulares e também Professor Assistente Doutor de Língua Portuguesa, Redação e Expressão Oral do Departamento de Comunicações e Artes da ECA-USP.

Bons motivos para cuidarmos da leitura
A leitura é um processo muito mais amplo do que podemos imaginar. Ler não é unicamente interpretar os símbolos gráficos, mas interpretar o mundo em que vivemos. Na verdade, passamos todo o nosso tempo lendo!
O psicanalista francês Lacan disse que o olhar da mãe configura a estrutura psíquica da criança, ou seja, esta se vê a partir de como vê seu reflexo nos olhos da mãe! O bebê, então, segundo esta citação, lê nos olhos da mãe o sentimento com que é recebido e interpreta suas emoções: se o que encontra é rejeição, sua experiência básica será de terror; se encontra alegria, sua experiência será de tranqüilidade, etc. Ler está tão relacionado com o fato de existirmos que nem nos preocupamos em aprimorar este processo. É lendo que vamos construindo nossos valores e estes são os responsáveis pela transformação dos fatos em objetos de nosso sentimento.
Leitura é um dos grandes, senão o maior, ingrediente da civilização. Ela é uma atividade ampla e livre – fato comprovado pela frustração de algumas pessoas ao assistirem a um filme, cuja história já foi lida em um livro. Quando lemos, associamos as informações lidas à imensa bagagem de conhecimentos que temos armazenados em nosso cérebro e então somos capazes de criar, imaginar e sonhar.
É por meio da leitura que podemos entrar em contato com pessoas distantes ou do passado, observando suas crenças, convicções e descobertas que foram imortalizadas por meio da escrita. Esta possibilita o avanço tecnológico e científico, registrando os conhecimentos, levando-os a qualquer pessoa em qualquer lugar do mundo, desde que saibam decodificar a mensagem, interpretando os símbolos usados como registro da informação. A leitura é o verdadeiro elo integrador do ser humano e a sociedade em que ele vive!
O mundo de hoje é marcado pelo enorme fluxo de informações oferecidas a todo instante. É preciso também tornarmo-nos mais receptivos e atentos, para nos mantermos atualizados e competitivos. Para isso, é imprescindível leitura que nos estimule cada vez mais em vista dos resultados que ela oferece. Se você pretende acompanhar a evolução do mundo, manter-se em dia, atualizado e bem informado, precisa preocupar-se com a qualidade da sua leitura.

As operações do ato de ler
Ao ler realizamos as seguintes operações:
1) Captamos o estímulo, ou seja, por meio da visão, encaminhamos o material a ser lido para nosso cérebro.
2) Passamos, então, a perceber e a interpretar o dado sensorial (palavras, números, etc.) e a organizá-lo segundo nossa bagagem de conhecimentos anteriores. Para essa etapa, precisamos de motivação, de forma a tornar o processo mais otimizado possível.
3) Assimilamos o conteúdo lido integrando-o ao nosso arquivo mental” e aplicando o conhecimento ao nosso
cotidiano
Livro interessante ou leitores interessados?
Observe: você pode gostar de ler sobre esoterismo e uma pessoa próxima não se interessar por este assunto. Por outro lado, será que esta mesma pessoa se interessaria por um livro que fale sobre História ou esportes? No caso da leitura, não existe livro interessante, mas leitores interessados.

Leitura eficiente
A pessoa que se preocupa com a qualidade de sua leitura e com o resultado que poderá obter, deve pensar no ato de ler como um comportamento que requer alguns cuidados, para ser realmente eficaz.
1) Atitude
Pensamento positivo para aquilo que deseja ler. Manter-se descansado é muito importante também. Não adianta um desgaste físico enorme, pois a retenção da informação será inversamente proporcional. Uma alimentação adequada é muito importante.
Cuidado! Devemos virar a página, segurando-a pelo lado superior, antes de lermos a última frase!
2) Ambiente
O ambiente de leitura deve ser preparado para ela. Nada de ambientes com muitos estímulos que forcem a dispersão. Deve ser um local tranqüilo, agradável, ventilado, com uma cadeira confortável para o leitor e mesa para apoiar o livro a uma altura que possibilite postura corporal adequada.
Quanto à iluminação, deve vir do lado posterior esquerdo, pois o movimento de virar a página acontecerá antes de ter sido lida a última linha da página direita e, de outra forma, haveria a formação de sombra nesta página, o que atrapalharia a leitura.
3) Objetos necessários
Para evitar de, durante a leitura, levantarmos para pegar algum objeto que julguemos importante, devemos colocar lápis, marca-texto e dicionários sempre à mão. Quanto sublinhar os pontos importantes do texto, é preciso aprender a técnica adequada. Não o fazer na primeira leitura, evitando que os aspectos sublinhados parecem-se mais com um mosaico de informações aleatórias.
Andréa Machado e Edson Teixeira

Os diferentes níveis de leitura
Ler é uma atividade muito mais complexa do que a simples interpretação dos símbolos gráficos, de códigos, requer que o indivíduo seja capaz de interpretar o material lido, comparando-o e incorporando-o à sua bagagem pessoal, ou seja, requer que o indivíduo mantenha um comportamento ativo diante da leitura. Para que isso aconteça, é necessário que haja maturidade para a compreensão do material lido, senão tudo cairá no esquecimento ou ficará armazenado em nossa memória sem uso, até que tenhamos condições cognitivas para utilizar.
De uma forma geral, passamos por diferentes níveis ou etapas até termos condições de aproveitar totalmente o assunto lido. Essas etapas ou níveis são cumulativas e vão sendo adquiridas pela vida, estando presente em praticamente toda a nossa leitura.
O PRIMEIRO NÍVEL é elementar e diz respeito ao período de alfabetização. Ler é uma capacidade cerebral muito sofisticada e requer experiência: não basta apenas conhecermos os códigos, a gramática, a semântica – é preciso que tenhamos um bom domínio da língua.
O SEGUNDO NÍVEL é a pré-leitura ou leitura inspecional. Tem duas funções específicas: primeiro, prevenir para que a leitura posterior não nos surpreenda e, sendo, para que tenhamos chance de escolher qual material leremos, efetivamente. Trata-se, na verdade, de nossa primeira impressão sobre o livro. É a leitura que comumente desenvolvemos “nas livrarias” .
Nela, por meio do salteio de partes, respondem basicamente às seguintes perguntas:
Por que ler este livro?
Será uma leitura útil?
Dentro de que contexto ele poderá se enquadrar?
Essas perguntas devem ser revistas durante as etapas que se seguem, procurando usar de imparcialidade quanto ao ponto de vista do autor, e o assunto, evitando preconceitos.
Se você se propuser a ler um livro sem interesse, com olhar crítico, rejeitando-o antes de conhecê-lo, provavelmente o aproveitamento será muito baixo.

LER É
armazenar informações;
desenvolver;
ampliar horizontes;
compreender o mundo;
comunicar-se melhor;
escrever melhor;
relacionar-se melhor com o outro.
Pré-leitura
Nome do livro
Autor
Dados bibliográficos
Prefácio e índice
Prólogo e introdução
Os passos da pré-leitura
O primeiro passo é memorizar o nome do autor e a edição do livro, fazer um folheio sistemático: ler o prefácio e o índice (ou sumário), analisar um pouco da história que deu origem ao livro, ver o número da edição e o ano de publicação. Se falarmos em ler um Machado de Assis, um Júlio Verne, um Jorge Amado, já estaremos sabendo muito sobre o livro, não é? É muito importante verificar estes dados para enquadrarmos o livro na cronologia dos fatos e na atualidade das informações que ele contém. Verifique detalhes que possam contribuir para a coleta do maior número de informações possível. Tudo isso vai ser útil quando formos arquivar os dados lidos no nosso arquivo mental!
A propósito, você sabe o que seja um prólogo, um prefácio e uma introdução? Muita gente pensa que os três são a mesma coisa, mas não:
PRÓLOGO: é um comentário feito pelo autor a respeito do tema e de sua experiência pessoal.
PREFÁCIO: é escrito por terceiros ou pelo próprio autor, referindo-se ao tema abordado no livro e muitas vezes também tecendo comentários sobre o autor.
INTRODUÇÃO: escrita também pelo autor, referindo-se ao livro e não ao tema.
O segundo passo é fazer uma leitura superficial. Pode-se, nesse caso, aplicar as técnicas da leitura dinâmica.
O TERCEIRO NÍVEL é conhecido como analítico. Depois de vasculharmos bem o livro na pré-leitura, analisamos o livro. Para isso, é imprescindível que saibamos em qual gênero o livro se enquadra: trata-se de um romance, um tratado, um livro de pesquisa e, neste caso, existe apenas teoria ou são inseridas práticas e exemplos. No caso de ser um livro teórico, que requeira memorização, procure criar imagens mentais sobre o assunto, ou seja, VEJA, realmente, o que está lendo, dando vida e muita criatividade ao assunto. Note bem: a leitura efetiva vai acontecer nesta fase, e a primeira coisa a fazer é ser capaz de resumir o assunto do livro em duas frases. Já temos algum conteúdo para isso, pois o encadeamento das idéias já é de nosso conhecimento. Procure, agora, ler bem o livro, do início ao fim. Esta é a leitura efetiva, aproveite bem este momento!
Fique atento!
Aproveite todas as informações que a pré-leitura ofereceu.
Não pare a leitura para buscar significados de palavras em dicionários ou sublinhar textos – isto será feito em outro momento!
O QUARTO NÍVEL de leitura é o denominado de controle. Trata-se de uma leitura com a qual vamos efetivamente acabar com qualquer dúvida que ainda persista. Normalmente, os termos desconhecidos de um texto são explicitados neste próprio texto, à medida que vamos adiantando a leitura. Um mecanismo psicológico fará com que fiquemos com aquela dúvida incomodando-nos até que tenhamos a resposta. Caso não haja explicação no texto, será na etapa do controle que lançaremos mão do dicionário.
Veja bem: a esta altura já conhecemos bem o livro e o ato de interromper a leitura não vai fragmentar a compreensão do assunto como um todo. Será, também, nessa etapa que sublinharemos os tópicos importantes, se necessário.
Para ressaltar trechos importantes opte por um sinal discreto próximo a eles, visando principalmente a marcar o local do texto em que se encontra, obrigando-o a fixar a cronologia e a seqüência deste fato importante, situando-o no livro.
Aproveite bem esta etapa de leitura!
Para auxiliar no estudo, é interessante que, ao final da leitura de cada capítulo, você faça um breve resumo com suas próprias palavras de tudo o que foi lido.
Um QUINTO NÍVEL pode ser opcional: a etapa da repetição aplicada. Quando lemos, assimilamos o conteúdo do texto, mas aprendizagem efetiva vai requerer que tenhamos prática, ou seja, que tenhamos experiência do que foi lido na vida. Você só pode compreender conceitos que tenha visto em seu cotidiano. Nada como unir a teoria à prática. Na leitura, quando não passamos pela etapa da repetição aplicada, ficamos muitas vezes sujeitos àqueles brancos quando queremos evocar o assunto. Para evitar isso, faça resumos! Observe agora os trechos sublinhados do livro e os resumos de cada capítulo, trace um diagrama sobre o livro, esforce-se para traduzi-lo com suas próprias palavras. Procure associar o assunto lido com alguma experiência já vivida ou tente exemplificá-lo com algo concreto, como se fosse um professor e o estivesse ensinando para uma turma de alunos interessados. É importante lembrar que esquecemos mais nas próximas 8 horas do que nos 30 dias posteriores. Isto quer dizer que devemos fazer pausas durante a leitura e ao retornarmos ao livro, consultamos os resumos. Não pense que é um exercício monótono! Nós somos capazes de realizar diariamente exercícios físicos com o propósito de melhorar a aparência e a saúde. Pois bem, embora não tenhamos condições de ver com o que se apresenta nossa mente, somos capazes de senti-la quando melhoramos nossas aptidões como o raciocínio, a prontidão de informações e, obviamente, nossos conhecimentos intelectuais. Vale a pena se esforçar no início e criar um método de leitura eficiente e rápido.
Andréa Machado e Edson Teixeira


Vícios de leitura
Como é seu comportamento de leitor?
Por acaso você tem o hábito de ler movimentando a cabeça? Ou, quem sabe, acompanhando com o dedo? Talvez vocalizando baixinho... Você não percebe, mas esses movimentos são alguns dos tantos que prejudicam a leitura. Esses movimentos são conhecidos como vícios de linguagem.
Movimentar a cabeça
Procure perceber se você não está movimentando a cabeça enquanto lê. Este movimento, ao final de pouco tempo, gera muito cansaço além de não causar nenhum efeito positivo. Durante a leitura apenas movimentamos os olhos.
Regressar no texto, durante a leitura
Pessoas que têm dificuldade de memorizar um assunto, que não compreendem algumas expressões ou palavras tendem a voltar na sua leitura. Este movimento apenas incrementa a falta de memória, pois secciona a linha de raciocínio e raramente explica o desconhecido, o que normalmente é elucidado no decorrer da leitura. Procure sempre manter uma seqüência e não fique “indo e vindo” no livro. O assunto pode se tornar um bicho de sete cabeças!
Ler palavra por palavra
Para escrever usamos muitas palavras que apenas servem como adereços. Procure ler o conjunto e perceber o seu significado.
Subvocalização
É o ato de repetir mentalmente a palavra. Isto só será corrigido quando conseguirmos ultrapassar a marca de 250 palavras por minuto.
Usar apoios
Algumas pessoas têm o hábito de acompanhar a leitura com réguas, apontando ou utilizando um objeto que salta “linha a linha”. O movimento dos olhos é muito mais rápido quando é livre do que quando o fazemos guiado por qualquer objeto.

Vidas Secas

Vidas Secas - Graciliano Ramos


From: vestibular, 11 months ago





by Etapa Vestibulares


SlideShare Link


Guimarães Rosa e o universalismo filosófico do sertão

Grande Sertão: Veredas

Página dos manuscritos originais de O Grande Sertão: Veredas

Médico e diplomata, o escritor mineiro João Guimarães Rosa (1908 - 1967) é um dos mais importantes exemplos nacionais de autor que consegue ser, ao mesmo tempo, regional e universal. Embora o cenário de seus textos seja geralmente o sertão mineiro, seu domínio vocabular e as questões existenciais que levanta conferem a sua obra uma densidade que atinge leitores de todo o planeta.Escrito em 1956, "Grande Sertão: Veredas" reúne as principais qualidades do escritor mineiro, principalmente o uso da linguagem popular e regional, muito influenciada pela língua falada. Isso sem contar uma das características do autor: a invenção de palavras e o desenvolvimento dos mais variados tipos de construções sintáticas.
Histórias de jagunços
O narrador é o jagunço Riobaldo, que conta suas aventuras pelo sertão a um ouvinte mais letrado que ele. A imensidão da paisagem cria um contraponto com a pequenez do homem e a sua dificuldade de se relacionar com o entorno e com os outros seres humanos.
Riobaldo, durante três dias, relata a sua história, repleta de episódios de lutas entre bandos rivais de jagunços e as forças repressoras oficiais. Após a morte da mãe, é levado para a fazenda de seu padrinho. Embora comece a estudar, logo aceita o convite para integrar o bando de Zé Bebelo. Combate, assim, o célebre Hermógenes e, posteriormente, deserta, ingressando em outro bando, onde conhece Reinaldo.Surge entre os dois uma grande amizade. Tornam-se companheiros inseparáveis de luta e Reinaldo revela seu verdadeiro nome, Diadorim. O relacionamento entre os dois tem episódios memoráveis, como o momento em que Riobaldo conhece Otacília, por quem se apaixona. Diadorim, então, em acalorada discussão, chega inclusive a ameaçá-lo com um punhal. Essa relação ambígua é de grande lirismo, pois o narrador não sabe como lidar com o sentimento de afeto que tem por um homem. Paralelamente, pouco a pouco, Riobaldo ganha importância entre os jagunços, assumindo a liderança do bando.
Deus, diabo e a morte
Em uma das principais cenas do livro, próximo a Veredas-Mortas, nome altamente significativo em seu simbolismo de limite entre a vida e a morte, Riobaldo faz, como o célebre personagem Fausto, um pacto com o diabo. Ele quer vencer os traidores que causaram diversas mortes aos colegas de luta. A grande revelação do romance ocorre quando Diadorim enfrenta Hermógenes. Ambos morrem em combate e Riobaldo descobre então que o companheiro jagunço era, na verdade, uma mulher, chamada Maria Deodorina da Fé Bettancourt Marins, filha de um célebre líder de jagunços, Joca Ramiro.Findas as aventuras e a descoberta inesperada, Riobaldo adoece. Ao se recuperar, recebe a notícia da morte de seu padrinho e herda duas fazendas. Aprofunda então uma questão que o acompanhava: teria ele feito mesmo um pacto com o diabo, conseguindo sobreviver a numerosas emboscadas e traições? O compadre Quelemém de Góis responde brilhantemente sua dúvida: "Tem cisma não. Pensa para diante. Comprar ou vender, às vezes, são as ações que são as quase iguais..."Frases como "o sertão é do tamanho do mundo" e "viver é perigoso" pontuam um romance que, acima de tudo, levanta importantes questões sobre a vida e a relação do homem com Deus, o diabo e a morte. As veredas do ser humano são tratadas com extrema sutileza e, enfocadas numa linguagem ímpar, oferecem densa reflexão sobre as célebres perguntas da filosofia ocidental: De onde viemos? Quem somos? Para onde vamos?
*Oscar D'Ambrosio, jornalista, mestre em artes pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista (Unesp), é crítico de arte e integra a Associação Internacional de Críticos de Artes (Aica - Seção Brasil).*Especial para a Página 3 Pedagogia & Comunicação

Guimarães Rosa

Sagarana - Guimar�es Rosa


From: vestibular, 11 months ago





by Etapa Vestibulares


SlideShare Link



Narrador e Eu poético

Imagine que ao abrir seu livro, você vê:

"Eu estava caminhando pela rua, quando vi aquela imagem inexplicável".

Provavelmente, não foi realmente o autor do livro quem viu a imagem, mas o "narrador" do livro. Ou seja, o escritor cria um "outro eu" - é o personagem que conta a história. Se a obra for um livro de poemas, pode haver um "Eu poético".

Dentro da obra literária, não é mais apenas autor em si que nos interessa, mas também as figuras literárias que ele inventa.

O escritor João Cabral de Melo Neto fala um pouco desse trabalho de criação do autor, em um texto chamado "O poema".




O autor é um criador. Ele inventa enigmas. Mas decifrar estes enigmas cabe a alguém tão importante quanto o autor: o leitor.

Obras anônimas, apócrifas, direitos autorais

  • Você sabe o que é uma obra apócrifa?
  • Já ouviu falar sobre questões de direitos autorais?
  • Ou sabe o que é um eu-poético?

Tudo são questões ligadas à autoria, que vamos discutir aqui.

Ao ler uma obra literária, é importante pensar em quem foi a pessoa que a escreveu, quando e onde viveu. Saber quem foi o autor da obra ajuda bastante na sua compreensão. Às vezes a obra pode ser anônima (quando não sabemos quem é o autor) ou até mesmo apócrifa (quando sua autenticidade não está provada). Mas estes casos são menos comuns. Geralmente os autores dos livros são conhecidos.Procure saber quem é o autor do livro que você está lendo. É um autor antigo ou é um autor contemporâneo (que vive em nossa época)? Se o autor for de outra época, você pode pesquisar sobre ele em uma biblioteca ou na internet. Verifique, por exemplo, nossa lista de biografias.
Biografia, aliás, é a história da vida de uma pessoa.Se o autor estiver vivo e morar na sua cidade, você pode tentar conversar com ele! Você pode pedir um autógrafo, mandar um e-mail e até tentar ligar para o autor, perguntando sobre o processo de criação do livro, fazendo um comentário. Geralmente os autores gostam de conversar com os leitores.
Direitos autorais
Hoje em dia se fala muito do assunto, já que o avanço da tecnologia deixou os autores em uma situação bastante delicada - por um lado, é muito fácil tirar cópias de um livro, transferi-lo pela internet; por outro, o autor perde o controle do que fazem com sua obra! É importante lembrar que o livro é o resultado do trabalho de um autor. Por isso o autor é quem detém os direitos autorais sobre a obra.Se você folhear o seu livro, vai encontrar nas primeiras páginas uma informação interessante: de quem é o copyright (os direitos autorais). O símbolo para copyright é um C no interior de um círculo. Ele nos indica a quem pertencem os direitos morais e patrimoniais sobre a obra. Os textos das obras literárias são protegidas por leis.O autor tem o direito de ver sua obra respeitada e também tem o direito de ganhar dinheiro pela publicação da obra. Quando alguém traduz, modifica ou copia um texto sem autorização está desrespeitando os direitos do autor e cometendo um ato de pirataria.Mas podemos citar um trecho de uma obra. Neste caso, indicamos o nome do autor do texto e o título do livro citado.

Editoras e fichas catalográficas

Os livros são publicados por editoras. Editora é a empresa que faz o texto escrito pelo autor virar um livro (revisa o texto, coloca imagens, cria o índice, etc).
Veja qual foi a editora que publicou o livro que você está lendo.
Você conhece outros livros desta editora?
Que tipo de livro ela costuma publicar?


Várias informações sobre a obra podem ser encontradas na ficha catalográfica, que vem impressa em uma das primeiras páginas do livro. Nela, além do título do livro e do nome do autor, você também vai descobrir o local onde o livro foi editado, a editora que o publicou e a data da publicação. Esses elementos ajudam a compreender as circunstâncias em que a obra foi publicada.


*Heidi Strecker é filósofa e educadora.

A LITERATURA CONTEMPORÂNEA

A GERAÇÃO DE 45


1.CLARICE LISPECTOR: A escritura selvagem.


2.GUIMARÃES ROSA: A linguagem reinventada.














3.JOÃO CABRAL DE MELO NETO: A linguagem objeto. O engenheiro da palavra.









Leituras dirigidas:
1. "Amor";
2. fragmento de Grande Sertão Veredas; Desenredo;
3. fragmento de Morte e vida severina.

Simplesmente Vinícius de Morais

TRABALHO SOBRE VINICIUS DE MORAES HOMENAGEM DA SALA 307 DO COLEGIO ESTADUAL SEVERINO VIEIRA DE SALVADOR BAHIA. PORTUGUÊS. "PARA AQUELES QUE DUVIDAM DAS NOSSAS CAPACIDADES HAHAHAHA MEUS PESSAMES".
PROFESSOR CARLOS
Assista no You Tube esse Documentário: http://www.youtube.com/watch?v=oSZXw0wRry4











Soneto da separação
De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.
De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama.
De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente.
Fez-se do amigo próximo o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente.
Vinícius de Moraes
Alguns links para você se deliciar:
Assista mais estes:

A Poesia Modernista

Uma definição para "A poesia de 30":

- Carlos Drummond de Andrade: um bruxo com amor
- Murilo Mendes: o franco-atirador da poesia
- Jorge de Lima: a consciência mutante
- Cecilia Meireles: o efêmero e o eterno
- Vinicius de Morais: um canto de poeta e de cantor


Atividade:
- O professor Willian Roberto Cereja, no livro "Literatura Brasileira" definiu assim cada um dos poetas modernistas. Por quê? Escolha um deles e justifique por meio de uma pesquisa na biblioteca, internet etc. Esta atividade deverá ser entregue manuscrita, em mãos. Obrigada!



Carlos Drummond de Andrade


(...) Pois de tudo fica um pouco.

Fica um pouco de teu queixo

no queixo de tua filha.

De teu áspero silêncio

um pouco ficou, um pouco

nos muros zangados,

nas folhas, mudas, que sobem.


Ficou um pouco de tudo

no pires de porcelana,

dragão partido, flor branca,

ficou um pouco

de ruga na vossa testa,

retrato.


(...) E de tudo fica um pouco.

Oh abre os vidros de loção

e abafa

o insuportável mau cheiro da memória.

(Resíduo)

A dialética iluminada de Drummond

"No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra".

Quando o poeta Carlos Drummond de Andrade publicou esse poema em 1928, "insignificante em si", diria mais tarde, talvez não imaginasse que fosse causar tanto escândalo e que seria motivo de tantas divergências. Uma brincadeira (ou não?) que renderia ao poeta censuras e elogios. Agora, 74 anos depois, quando se comemora o centenário de nascimento do poeta (31 de outubro), a polêmica parece esquecida – e o poema agora é visto sob um outro ângulo.
Poeta, contista e cronista, Drummond é considerado um dos maiores poetas da língua portuguesa e da literatura latino-americana. É respeitado por críticos nacionais e estrangeiros como um dos grandes poetas universais. Funcionário público, homem de natureza reservada, avesso principalmente às entrevistas, só mesmo no fim da vida o mineiro de Itabira, Minas Gerais, se liberou para as manifestações pessoais. Cada vez mais freqüentes, elas foram uma voz lúcida e iluminada. Ao longo de sua vida, produziu mais 40 livros, muitos deles traduzidos para países como França, Inglaterra, Itália, Alemanha, Suécia, Argentina, Chile, Peru, Cuba, Estados Unidos, Portugal, Espanha e Tchecoslováquia.
Para Alcides Villaça, professor de Literatura Brasileira da USP e ex-professor-visitante da Unicamp, especialista em Drummond, a importância do poeta para a poesia brasileira "está na altura a que ele elevou um discurso poético carregado, ao mesmo tempo, de reflexão inteligente e fortíssima sensibilidade, de tal modo que o leitor é envolvido por uma onda rítmica, onde belas imagens e iluminações do pensamento se dialetizam o tempo todo".
Nos poemas da década de 50, sobretudo em Claro Enigma (1930), é forte a presença de Paul Valery, de cujos versos Drummond se valeu na epígrafe do livro. "Mas é bom ressaltar que, acima de qualquer influência sofrida, a poesia de Drummond é personalíssima, individualíssima, tanto nos temas que freqüenta (entre eles, as raízes mineiras e provincianas, a oposição entre o arcaico e o moderno) como nas várias soluções de estilo que adotou ao longo dos seus mais de 60 anos de poesia", conta Villaça. Acompanhar as chamadas "fases" da poesia de Drummond, segundo observações do professor, significa ir reconhecendo uma sucessão muito variada de formas, que foram respondendo às suas também variadas perspectivas do mundo e necessidades de expressão.
O "modernismo" de Drummond, no sentido estrito que o liga ao Movimento de 22, está, sobretudo, no primeiro livro que o poeta publicou: Alguma poesia (1930), justamente no humor piadístico e num acentuado desejo de expressar o instante, o cotidiano, a "nota social" -- além de cultivar uma linguagem desconcertante e fragmentária, como no Poema de sete faces, por exemplo. "Mas a pedra de toque foi mesmo o No meio do caminho, que gerou tantas controvérsias e tantos comentários que, décadas mais tarde, o poeta publicou um livro -- No meio do caminho -- História de um poema, onde reúne todas as reações, glosas, paródias, censuras ou elogios que o poema provocou. O escândalo associava-se à forma do poema, repetitiva e circular, que irritava os ouvidos acostumados às harmonizações da poesia convencional, bem como aos enigmas da expressão "pedra no caminho", que todo mundo queria porque queria "decifrar", explica o professor Villaça. Talvez até fosse resultado de uma brincadeira do poeta.
Sozinho, entre mangueiras
Carlos Drummond de Andrade nasceu em Itabira, Minas Gerais, em 1902, e morreu no Rio de Janeiro, em 1987, aos 85 anos. Passa boa parte da infância na fazenda da família, "sozinho, entre mangueiras" , como diria, mais tarde, em seu poema Infância, publicado em Alguma Poesia. É tido como um dos mais maiores poetas que o Brasil já teve, comparado aos maiores poetas estrangeiros. Drummond foi redator do Diário de Minas. Mais tarde foi responsável pela abertura no jornal de textos modernistas. Depois de haver completado o curso de Farmácia, atividade profissional que não exerceu, foi convidado pelo amigo Augusto Capanema, então Ministro da Educação, para chefiar o referido gabinete, em 1930. Mais tarde, Drummond tornou-se chefe do Serviço do Em 1930 lança Alguma Poesia e, em 1934, Brejo das Almas, ambos com textos carregados de fina ironia. Foi uma fase que, enquanto ironizava os costumes e a sociedade, asperamente satírico em seu amargor e desencanto, entrega-se com empenho e requinte construtivo à comunicação estética desse modo de ser do poeta de Itabira.
Em Confissões de Minas (1944), obra de Ensaios e Crônicas, Carlos Drummond de Andrade admitia: "Entro para a antologia, não sem registrar que sou o autor confesso de certo poema, insignificante em si, mas que a partir de 1928 vem escandalizando meu tempo, e serve até hoje para dividir no Brasil as pessoas em duas categorias mentais". Referia-se ao poema No Meio do Caminho. Drummond publicou aproximadamente 50 livros. Teve ainda obras publicadas em espanhol, inglês, francês, italiano, alemão, sueco, tcheco, entre outras línguas.
Em 1987, doze dias depois da morte de sua única filha Maria Julieta, Drummond morria a 17 de agosto, deixando obras inéditas como O Avesso das Coisas, O Amor Natural e Moça Deitada Na Grama.

Horizontes e limites no mundo prosaico

No entanto, como se vê, a ironia é uma constante na poesia de Drummond, que nasce, segundo Villaça, "do contraste entre um forte idealismo, que está sempre no horizonte dos afetos e da consciência do poeta, e uma forte experiência dos limites que há em cada indivíduo e no mundo prosaico em que vivemos". Sua ironia nasce a cada vez que o poeta se defronta com a impossibilidade de realizar as altas aspirações humanas que estão nele, como em quase todos nós: amar e/ou conhecer o outro de modo absoluto, conhecermo-nos a nós mesmos de modo absoluto. "Talvez o existencialismo sartreano tenha deixado no poeta a convicção de que de fato "o inferno são os outros", ao mesmo tempo em que o sentimento de responsabilidade pessoal para com o mundo faça de cada um de nós o responsável pela liberdade de todos", acredita Villaça.
Carlos Drummond de Andrade, que escreveu José, Resíduo e A morte do leiteiro era um homem reservado, cioso da sua intimidade, em geral avesso a entrevistas e contatos pessoais. Muitos de seus amigos como Mário de Andrade, primeiro, e Ziraldo, depois, sentiram seu grande interesse em conversar por telefone ou por cartas, muito maior do que em papear "cara a cara". Drummond preferia passar uma hora ao telefone a se encontrar com alguém em sua casa. "No entanto, aos sábados, reunia-se sempre com seus amigos - escritores e intelectuais - - na casa de Plínio Doyle, eventos que acabaram sendo chamados de os "sabadoyles". Nessas reuniões, até ata faziam. Só não conversavam sobre política, para não azedarem a conversa", diz o professor.
Villaça recorda-se que Pedro Nava, no seu livro de memórias Beira-mar, fala muito das "travessuras" do grupo de jovens intelectuais da Belo Horizonte dos anos 20, entre os quais estava um Drummond de óculos e bigodinho, de aspecto grave, respeitado por todos, mas capaz de gestos tresloucados, como escalar um alto arco de pontilhão e desafiar o guarda-noturno, que lhe dera voz de prisão, a ir buscá-lo lá em cima. O grupo costumava freqüentar a zona de meretrício de Belo Horizonte, de onde os rapazes saíam melancólicos e cheios de fossa existencial... Os prazeres sexuais facilmente atendidos provocaram no poeta grandes remorsos, uma sensação de "nojo de si mesmo", sentimento que se expressa em boa parte dos poemas do livro Brejo das almas e não deixa de ecoar num poema como a Mão suja.

O especialista que veio da Bulgária

A convite da Unicamp, o professor Rumen Stoyanov, da Universidade de Sófia, na Bulgária, proferiu uma conferência no Instituto de Estudos da Linguagem (IEL). Stoyanov é um dos mais importantes tradutores de escritores brasileiros. E Carlos Drummond de Andrade, com o qual manteve um relacionamento de mais de 13 anos, é um deles. E não é de se estranhar que o poeta brasileiro seja um dos escritores mais conhecidos na Bulgária.
Professor de Literatura e Cultura do Brasil na Universidade de Sófia, Stoyanov acaba de escrever, em português, o livro Drummond e a Bulgária, ainda inédito. Trata-se, segundo diz, de uma obra na qual traz minucioso trabalho de pesquisa sobre o que Carlos Drummond de Andrade escreveu em versos e prosa sobre a Bulgária. Além de conter farto material sobre o que a crítica do seu país escreveu sobre o poeta mineiro, aborda também uma série de correspondências, ensaios e citações a respeito do poeta brasileiro.
Stoyanov diz que Drummond era um poeta bastante admirado na Bulgária e que seu povo tem grande admiração e simpatia pela literatura brasileira, em especial a poesia do poeta de Itabira. Stoyanov conta que o poeta teve 13 livros traduzidos para o búlgaro por especialistas em Drummond. Um deles é o próprio Stoyanov. Para ele, Drummond, "é, sem dúvida, o mais importante poeta da nossa época. Tanto é que, passados mais de 15 anos de sua morte, ainda é reverenciado no meu país, desfrutando de alto prestígio não apenas entre os intelectuais, mas também entre o povo. Eu diria que, devido à força de concisão do poeta brasileiro, Drummond é tão ou até mais importante que Pablo Neruda".


Um legado de rigor e experimentação

Para o professor Paulo Franchetti, do Departamento de Teoria Literária do Instituto de Estudos da Linguagem da Unicamp (IEL), e atual diretor da Editora da Unicamp, Drummond representa o momento de consolidação da poética modernista no Brasil. Por isso mesmo, é uma das maiores vozes líricas da poesia brasileira do século 20. "Acredito que o lugar de Drummond para as gerações atuais, para a literatura que se pratica hoje no Brasil, é assegurado, não pelos primeiros livros modernistas que publicou, como Alguma Poesia (1930) e Brejo das Almas (1934), que têm um interesse mais propriamente histórico hoje, mas mais pela alta dicção do poeta a partir de José", observa o professor. Mas assinala que a grande obra de Drummond é aquela que compôs entre José e Lição de Coisas, este na década de 60. Franchetti acredita que a partir do livro Claro enigma (1952), Drummond tenha deixado um legado de extrema importância para a poesia contemporânea de rigor, de experimentação, de sobriedade e de recuperação das formas tradicionais da literatura.
Os poemas de Drummond que Franchetti mais aprecia são Máquinas do mundo, Rapto e outras obras que pertencem a essa fase. Muito mais do que os poemas-piadas de começo da carreira, que tiveram, evidentemente, a sua importância, algumas obras até polêmicas como No Meio do Caminho, que à época tinham um efeito demolidor e era lido mais como um ato de intervenção. "Era um tipo de poesia mais conceitual, que naquele momento tinha uma inserção dentro de uma polêmica pela afirmação de novos critérios estéticos. Creio que esse lado vem alcançando um interesse histórico cada vez maior e que o Drummond de hoje, presente na linguagem de nossos poetas, é o poeta das décadas de 40 e 50. Mesmo o Drummond político de Sentimento do Mundo (1940) e A Rosa do Povo (1945), embora seja um grande poeta, não me parece que nesse momento está tão presente na poesia que se faz hoje no Brasil", avalia.
Para o professor da Unicamp, Drummond é um poeta de expressão internacional. "É um dos poetas brasileiros que foram mais traduzidos. Acredito que ele tem uma inserção internacional ao lado de João Cabral de Mello Neto. No entanto, é difícil fazer comparações. Não resta dúvida que é um poeta lido em várias línguas e que representa, em qualquer língua, um momento elevado da lírica do século 20".

O profano e a concepção fragmentária

Poeta abundante, multifacetado, Drummond segue estudado sob ângulos também variados. A professora Suzy Sperber, do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) da Unicamp, encontra em sua poesia até mesmo "o espaço do sagrado" - tema de um ensaio recente.
"A apreensão do real e das dimensões do espírito humano aproximam Carlos Drummond de Andrade da mais profunda compreensão do sagrado", escreve Suzy. "Há diferentes poemas cujo tópico trata da urbe, da produção da poesia, da natureza, ou do corpo. Ao usar o recurso da enumeração caótica, ou, tematicamente, quando ele fala sobre as urbes cindidas, sobre o cotidiano esfacelado, Drummond aborda um tema caro para a modernidade: o mundo fragmentado. A concepção fragmentária do mundo se deve a uma concepção profana, que se define pelos instantes, pelas obrigações de trabalho, sociais", assinala a professora.
Ela explica que "o imediatismo das ações e eventos dificulta a compreensão do todo, do evento inserido no mundo, passando a ter um estatuto ontológico disperso, diferente. Desvaloriza a vida em sociedade, a solidariedade, levando o ser humano para uma solidão última, no limite sartreana. Nos poemas de Drummond também se percebe a angústia do eu lírico diante uma tendência para o novo a todo custo, para o apagamento das raízes, de tradições, de valores, de ética, caracterizadores das atuais misérias humanas". ANTONIO ROBERTO FAVA. Acesso em: www.unicamp.br/.../unihoje_ju194pag06.html

NO MEIO DO CAMINHO

No meio do caminho tinha uma pedra

tinha uma pedra no meio do caminho

tinha uma pedra

no meio do caminho tinha uma pedra.


Nunca me esquecerei desse acontecimento

na vida de minhas retinas tão fatigadas.

Nunca me esquecerei que no meio do caminho

tinha uma pedra

tinha uma pedra no meio do caminho

no meio do caminho tinha uma pedra

En Revista de Antropofagia, 1928 Incluido en Alguma poesia (1930)
Véase
Carlos Drummond de Andrade y la fábula de la piedra Carlos Drummond de Andrade